O NATAL DOS CINCO CRUZEIROS
Em uma noite agradável na
vila de Alter do Chão, estávamos sentados, eu, Patrícia, Tiago e Telma, há uns
quatro ou cinco anos. As crianças terminavam um lanche e como aproximava-se a hora
de irem dormir, adiantei-me em pedir a conta. Quando o garçom se aproximou, notei
que o mesmo nos observava com alguma curiosidade. Seguiu-se mais ou menos o
seguinte diálogo:
- Posso lhe perguntar uma
coisa?
- Claro.
- O senhor é filho do seu
Emir e da dona Berenice?
-
Sim, sou.
- Quando eu lhe vi aqui,
pedi ao outro garçom para trocar comigo, pois queria ter o prazer de atender
alguém da tua família.
Diante da minha curiosidade,
continuou:
- Tu não te lembras de mim?
Eu vendia garrafa e vassoura e sempre passava pela casa de teus pais para...
-
Lembrei! Tu não eras bem lourinho e tinha
outros irmãos parecidos contigo?
- Isso. Era eu e mais cinco
irmãos homens e quatro mulheres. Lá em casa, brigávamos para ir na tua casa
oferecer vassoura, pois várias vezes aconteceu de ser aquela a única chance de
comermos alguma coisa no dia, pois tua mãe sempre dava um jeito de nos alimentar.
E olha... isso não foi só
uma ou duas vezes, foi durante toda a nossa infância. Só que uma vez, aconteceu
uma coisa que eu nunca vou me esquecer...
Com os olhos lacrimosos, continuou:
- Era véspera de Natal. Não
tínhamos nada em casa. Quando eu digo nada, é nada mesmo, pois parece que todos
se uniram pra dizer NÃO. Eu e meus irmãos não vendemos nada, e estávamos com muita
fome. Resolvemos sair para pedir comida nas casas próximas. Não conseguimos
nada, pois nossos vizinhos também passavam necessidade. Resolvemos ir andando
para o centro da cidade pedir em algumas casas onde vendíamos as vassouras e as
garrafas, mas sempre acontecia alguma coisa: ou a casa estava fechada ou os donos
não estavam em casa. Já era quase fim da tarde e não sabíamos o que fazer. Foi
aí que chegamos na tua casa. Tua mãe nos recebeu e nos deu a nossa primeira
refeição daquele dia e, enquanto comíamos, nos perguntou sobre como seria o
Natal em nossa casa. Contamos o que estava acontecendo, e ela pediu para
esperarmos um pouco e entrou. Depois, veio junto com teu pai, que conversou com
a gente sobre a sinceridade do que estávamos falando. Após nos ouvir com atenção,
nos entregou uma nota de cinco cruzeiros para levarmos para casa e fazermos nosso
almoço de Natal. À partir desse dia, teu pai ficou conhecido lá em casa como “o
homem dos cinco cruzeiros do Natal”, pois durante toda a infância, minha e de
meus irmãos, nunca tivemos um almoço de Natal igual àquele.
Já não era só dos olhos do rapaz que brotavam
lágrimas, pois se esse gesto lhe pareceu grandioso, imagine se soubesse, como
hoje eu sei, das dificuldades financeiras que meus pais passavam, mesmo nessa
época de Natal. Da luta e das renúncias para agradar a cada um de nós com
alguns presentes, que tanto feriam o apertadíssimo orçamento doméstico. Após as
despedidas com o garçom, que me deu um forte abraço e me desejou felicidades,
fiquei pensando algumas coisas, enquanto caminhávamos. Pensando que aquele
rapaz tirou de um gesto de meus pais uma lição para sua vida. Pensando que eu
tive a oportunidade de ter uma lição dessas a cada dia, pois sendo seu filho
foi exatamente isso que eu tive, uma lição de vida a cada dia.
Feliz Natal, papai e mamãe!
(Lúcio
Bemerguy - Natal de 2001)
Amigos Emir e Lucinho,
ResponderExcluirLi o texto e fiquei profundamente emocionado... Muitíssimo obrigado por vocês compartilharem essa bela história do Dr. Emir.
Abraços fraternos,
Samuca
Comentar como e prá quê, se tudo já foi dito ???!!!
ResponderExcluirSaudações Tapajônicas,
Nilson Vieira