HISTÓRIAS
DE PESCADORES
Foi há uns dez anos. Entrei no
escritório do empresário Hélcio Amaral e vi uma placa pendurada na parede. Li o
texto e fiquei rindo, a louvar o espirituoso autor anônimo da pequena frase: “Aqui
se reúnem caçadores, pescadores e outros mentirosos”. É apenas meia-verdade
essa velha certeza de que sempre se deve duvidar das histórias narradas por
quem caça ou pesca. Naturalmente, para vergonha nossa, não faltam os sujeitos
exagerados, que costumam aumentar o peso e o tamanho de suas vítimas. A
maioria, porém, conta corretamente o que aconteceu no rio, na selva, no lago,
no mar. Só quem nunca se meteu nessas deliciosas aventuras, fica achando que
tudo é invencionice. Vou repassar a você alguns casos absolutamente verídicos.
Duvide, se quiser.
Hilário Coimbra procurava
tucunarés, arrastando o seu corrico por essas beiradas. Conversava com o
parceiro do bote, quando, de repente, viu a isca de metal erguer-se no ar. Foi
subindo, subindo, até despencar novamente dentro d'água. O sem-vergonha de um
gavião enganou-se e, pensando que era um peixinho vivo, tocou o bico no ferro!
Por um triz não se fisgou no anzol!
José Sarmento, meu robusto amigo
contabilista, ia também corricando ali ao redor da Ilha dos Periquitos. Não
pegava nada - como sempre - até que criou alma nova ao sentir o peso da linha.
Pelo jeito, se não fosse um galho de pau, era um tremendo tucunaré. Foi
recolhendo o fio e acabou tomando um baita susto: havia anzolado um...
mergulhão! O arisco bicho nadava pelo fundo, sendo apanhado pela isca de ferro.
São histórias de pescadores, mas acontecidas e testemunhadas.
Alberto Dezincourt, o velho
Marçal, é o pescador mais completo de Santarém. Conhece do espinhel à tarrafa,
da pinauaca ao arpão, da malhadeira ao corrico. Ele conta que um amigo seu era
tripulante de um grande navio. O barco estava fundeado, chegou a hora de sair
e o comandante mandou levantar ferros. Estranhamente, a máquina puxadora
trabalhava e nada acontecia. Tiveram que convocar mergulhadores para saber que
mistério ocorria lá embaixo. Descobriram que uma colossal jamanta - a arraia do
mar - dormia sobre as âncoras... Diz Marçal, repetindo a narrativa do amigo,
que foi difícil acordar a distinta e fazê-la andar para que o navio se
libertasse. Por esse “causo” não meto a mão no fogo. Parece história de
pescador criativo.
Alfredo Oliveira é o mais antigo
pescador de mergulho que temos em Santarém. Já estraçalhou milhares de enormes
tucunarés, pirapitingas, surubins e o que aparecer. Ainda está em plena forma e
sabe milhões de gostosas histórias, algumas arrepiantes. Viu Mapinguari,
Curupira, Matinta-pereira, ouviu guariba falar com caçador. Conta que ali no
Cais do Porto pegou carreira de uma arraia para ninguém pôr defeito: a bichona
tinha um metro de distância entre um olho e outro! Se o sujeito não boiasse
logo, o monstro o esmagaria, jogando-se várias vezes em cima dele. Quando eu
fui apresentado a essa arraia do Alfredo, lembrei-me da jamanta do Marçal...
Por último, uma historinha de
confiabilidade total. Arnaldo Lisboa, eu e o Guiri puxávamos enormes sardinhas,
à noite, lá de cima do Cais do Porto. Usávamos pedacinhos de camarão quando, em
dado momento, vimos o impossível: Guiri fisgou algo estranho, que se debatia
muito. Jogada a vítima sobre o chão, foi uma gargalhada só, pois um vasto
morcego estava devidamente anzolado! Ao comer a isca, o rato que resolveu ser
aviador ficou preso e deu trabalho para sair da linha. Arnaldo e eu advertimos
o infeliz Guiri: “Quem pega morcego, nunca mais há de pescar nada que preste”.
Desfaz-se a reunião de caçadores, pescadores e outros cidadãos confiáveis.
(Emir Bemerguy – Santarenices)
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